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domingo, 22 de abril de 2018

Cidadela (A.J. Cronin)



Cidadela (A.J. Cronin)

O livro que motivou esta resenha é uma aula de filosofia materialista. Explico: fica bem difícil lê-lo sem ter em vista os conflitos da vida material do protagonista, Andrew Manson. A Cidadela é um romance lançado em 1937 pelo escocês Archibald Joseph Cronin. Através de um realismo cáustico, cria uma história que expressa anseios de vozes que na realidade não conseguem ser audíveis. Caso tenha interesse, também existe um filme (do cinema mudo) desta história, de 1938.

Se o trabalho compulsório persiste ainda hoje, não era diferente à época do seu lançamento, no início do século XX. Os operários das minas de carvão do País de Gales morreram de tuberculose, câncer ou em desastres como desmoronamentos de rochas nas minas ou até no desabamento de entulhos em Aberlan, fato bastante cruel que vitimou crianças, trabalhadores e trabalhadoras.

Uma rápida pesquisa e vemos que o substantivo que titula o livro, Cidadela, consiste numa proteção que rodeia uma cidade ou um castelo, ou seja, como se fosse uma fortaleza. Bem, faz sentido se pensarmos que Andrew chega completamente exposto, inseguro, pobríssimo, à sua nova vida, em uma cidade desconhecida, com pessoas desconhecidas, buscando algum tipo de base para se sustentar, pois não tem nem o socorro familiar por causa da morte dos pais. É como se fosse uma saga de uma pessoa normal em busca de segurança.  Explico melhor nas palavras seguintes.

Sinopse

Andrew Manson é um recém-formado medido britânico. Ele consegue o seu primeiro emprego como auxiliar de médico numa cidade no País de Gales, cuja economia gira em torno da extração de carvão nas minas. Jovem, inseguro, tímido, o que viu na prática foi bem diferente. Ele se deparou com a responsabilidade de ser médico principal, uma vez que o chefe da clínica estava na realidade quase morrendo por uma doença gravíssima.

A população operária da cidade sofre com a insalubridade nas condições de trabalho, no entanto, como estamos aqui no início do século XX, não se sabe que os problemas de saúde são oriundos do ar tóxico das minas. Muito pobre, Andrew se tornou órfão ainda no início da sua formação universitária, e teve que financiá-la, endividando-se, para conseguir se formar.

A história vai para o seu eixo central depois que o médico se consolida, já casado com o amor da sua vida, a professora Christine, que, como era costumeiro naquela sociedade ainda mais patriarcal, se aposentou do seu ofício para ser dona de casa. Mudando-se para cidades e clínicas com melhores condições, ele se vê cada vez mais inserido na classe média, que ele tanto desprezava até pouco tempo atrás. Será que ele vai persistir com seu desprezo às classes médias? Aos médicos que fazem de tudo para ganhar dinheiro? Em melhores condições materiais, ele permanece incorruptível na indignação com a desigualdade social?

O que ficou do que passou: minha interpretação

A vida material influencia de forma decisiva os pensamentos das pessoas — é o que propagava aquele barbudo, Marx o nome dele. Considero que esse seja o fio condutor das ações do protagonista da história. Foram as suas privações que o fizeram sensível às condições degradantes com as quais os trabalhadores tinham que conviver, e é pela melhoria em sua condição de vida que ele corre o risco de se esquecer do que ele tanto defendia. Uma ressalva, é claro: o autor não expressa tal intenção; é apenas uma leitura particular.

O escritor do livro também tem formação em medicina e possivelmente trouxe bastante da própria experiência, sobretudo no começo do livro, quando o médico sofria com a insegurança de quem está apenas começando. Outro trabalho do escritor que tem uma pegada parecida é Anos de Tormenta (Shannon’s Way), romance no qual o autor também mostra as dificuldades de um médico inexperiente em consolidar a carreira, e a satisfação que advém da superação dessas barreiras.

Livro fenomenal, intenso por demais! Deu seguimento à sequência de livros incríveis com os quais estou tendo a sorte de me deparar. A linguagem do escritor não é a mais agradável do mundo. Seu êxito reside no enredo, na intensidade das reflexões que suscita, possibilitando interpretações diversas, tanto subjetivas quanto, como a que aqui foi feita, sociológicas. Super indico para quem procura um livro com uma boa e intensa história, não para quem quer leveza


Matheus Andrade,
22/04/2018

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